
Auxiliar em um consultório odontológico, Mônica Santos, então com 30 anos, moradora do distrito de Bento Rodrigues, em Mariana (MG), saiu de casa para o trabalho naquele dia 5 de novembro perto das 6h da manhã. Era preciso sair cedo para chegar na hora. Ela não imaginava que só veria sua casa de novo 24 horas depois coberta de lama e que dez anos depois ainda lutaria por justiça.
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Mesmo passado uma década, a dor e a visão dos escombros ainda estão nítidas em sua memória. “É como se estivesse tudo acontecendo agora”, disse a líder comunitária. Atualmente, Mônica está desempregada.
Naquele dia, a barragem do Fundão, operada pela empresa Samarco, se rompeu liberando cerca de 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos de mineração. O desastre matou 19 pessoas e deixou mais de 600 desabrigadas. Outras comunidades afetadas foram Paracatu de Baixo, Paracatu de Cima, Pedras, Águas Claras e Campinas.
Mônica lembra com clareza daquela tarde em que recebeu a ligação de uma prima, avisando sobre o rompimento da barragem. Desesperada, saiu em busca da mãe no trabalho e tentou seguir para casa. Passou horas na estrada, entre a tarde e a madrugada, até que, ao amanhecer, chegou a um ponto mais alto e avistou o local onde antes ficava sua casa. “Foi nesse momento que a ficha caiu. Eu não tinha mais nada”, recorda.
Mônica morava apenas com a mãe no distrito de Bento Rodrigues, em Mariana (MG), atingido pelo rompimento das barragens de rejeitos da Samarco. Ela conta que a empresa sempre afirmava que a comunidade podia dormir tranquila, pois a barragem era monitorada 24 horas por dia. No desastre, Mônica perdeu cinco amigos próximos.
Hoje, ela vive no reassentamento de Novo Bento Rodrigues, entregue pela Samarco, a cerca de 13 quilômetros do antigo distrito. “Mas a nossa casa ainda tem muitos problemas. Não dá pra dizer que foi entregue 100%. Ainda há casas em construção e famílias sem moradia nem projeto aprovado”, relata.
Como liderança comunitária, Mônica afirma que continuará lutando por justiça. “Enquanto eu tiver força, vou lutar para que todos sejam realmente indenizados e restituídos”, diz. Ela denuncia ainda que as casas entregues não estão no nome dos moradores. Sua maior esperança é ver todos reassentados, indenizados e com os responsáveis devidamente punidos. “Se tivesse havido punição, a tragédia de Brumadinho não teria acontecido”, lamenta.
Para Márcio Zonta, integrante da direção nacional do Movimento pela Soberania Popular na Mineração, o desastre de Mariana revela como as decisões sobre mineração são tomadas sem a participação das comunidades. “São projetos antidemocráticos, que desconsideram a população e suas organizações”, avalia.
Segundo ele, as reparações oferecidas às vítimas são insuficientes e o país carece de um projeto nacional de mineração. O Brasil possui 916 barragens — 74 com alto risco de colapso e 91 em situação de alerta. Zonta alerta que tragédias semelhantes ainda podem se repetir, especialmente em Minas Gerais, onde estão 31 dessas estruturas. “É lá que a Vale iniciou o chamado Sistema Sul de Mineração, enquanto o Sistema Norte fica na Amazônia”, explica. Para o ativista, os desastres de Mariana e Brumadinho simbolizam o colapso desse modelo de exploração mineral no país.


